Obras Espíritas

O PROGRAMA DO SENHOR

ApóstolosNos dias atuais, assim como no passado, o homem sempre procura o caminho mais fácil ou aquele que lhe é peculiar. Hoje em dia vemos o centro espírita que leva a mensagem do trabalho, da tolerância, da paciência, da resignação, do respeito, do amor e da caridade com seus salões vazios. Em contrapartida, vemos multidões adentrarem templos de toda espécie que prometem “prosperidade”, que “prevêem” o futuro, que “desvendam” o passado, que “distribuem conselhos” para toda sorte de ações do cotidiano particular.

O que queremos?

O reino do mundo com suas ilusões materialistas ou o Reino de Deus com seu exercício constante dos reais ensinamentos do Cristo?

Na crônica de Humberto de Campos veremos que, tanto no passado como no presente, os homens continuam sem compreender as lições do Mestre e ainda se perdem na fria casuística ou nos interesses próprios.

Centro Espírita Vinhas do Senhor
Pouso Alegre/MG, 15 de dezembro de 2014.

O PROGRAMA DO SENHOR

 

Pontos e Contos – FEB
Humberto de Campos – Psicografia de Francisco Cândido Xavier

 

A frente da turba faminta, Jesus multiplicou os pães e os peixes, atendendo à necessidade dos circunstantes.

O fenômeno maravilhara.

O povo jazia entre o êxtase e o júbilo intraduzíveis.

Fora quinhoado por um sinal do Céu, maior que os de Moisés e Josué.

Frêmito de admiração e assombro dominava a massa compacta.

Relacionavam-se, ali, pessoas procedentes das regiões mais diversas.

Além dos peregrinos, em grande número, que se adensavam habitualmente em torno do Senhor, buscando consolação e cura, mercadores da Iduméia, negociantes da Síria, soldados romanos e cameleiros do deserto ali se congregavam em multidão, na qual se destacavam as exclamações das mulheres e o choro das criancinhas.

O povo, convenientemente sentado na relva, recebia, com interjeições gratulatórias, o saboroso pão que resultara do milagre sublime.

Água pura em grandes bilhas era servida, após o substancioso repasto, pelas mãos robustas e felizes dos apóstolos.

E Jesus, após renovar as promessas do Reino de Deus, de semblante melancólico e sereno contemplava os seguidores, da eminência do monte.

Semelhava-se, realmente, a um príncipe, materializado, de súbito, na Terra, pela suavidade que lhe transparecia da fronte excelsa, tocada pelo vento que soprava, de leve…

Expressões de júbilo eram ouvidas, aqui e ali.

Não fornecera Ele provas de inexcedível poder? não era o maior de todos os profetas? Não seria o libertador da raça escolhida?

Recolhiam os discípulos a sobra abundante do inesperado banquete, quando Malebel, espadaúdo assessor da Justiça em Jerusalém, acercou-se do Mestre e clamou para a multidão haver encontrado o restaurador de Israel. Esclareceu que conviria receber-lhe as determinações, desde aquela hora inesquecível, e os ouvintes reergueram-se, à pressa,

engrossando fileiras, ao redor do Messias Nazareno.

Jesus, em silêncio, esperou que alguém lhe endereçasse a palavra e, efetivamente, Malebel não se fez rogado.

– Senhor – indagou, exultante –, és, em verdade, o arauto do novo Reino?

– Sim – respondeu o Cristo, sem, titubear.

– Em que alicerces será estabelecida a nova ordem? – prosseguiu o oficial do Sinédrio, dilatando o diálogo.

– Em obrigações de trabalho para todos.

O interlocutor esfregou o sobrecenho com a mão direita, evidentemente inquieto, e continuou:

– Instituir-se-á, porém, uma organização hierárquica?

– Como não? – acentuou o Mestre, sorrindo.

– Qual a função dos melhores?

– Melhorar os piores.

– E a ocupação dos mais inteligentes?

– Instruir os ignorantes.

– Senhor, e os bons? Que farão os homens bons, dentro do novo sistema?

Ajudarão aos maus, á fim de que estes se façam igualmente bons.

– E o encargo dos ricos?

– Amparar os mais pobres para que também se enriqueçam de recursos e conhecimentos.

– Mestre – tornou Malebel, desapontado –, quem ditará semelhantes normas?

– O amor pelo sacrifício, que florescerá em obras de paz no caminho de todos.

– E quem fiscalizará o funcionamento do novo regime?

– A compreensão da responsabilidade em cada um de nós.

– Senhor, como tudo isto é estranho! – considerou o noviço, alarmado – desejarás dizer que o Reino diferente prescindirá de palácios, exércitos, prisões, impostos e castigos?

– Sim – aclarou Jesus, abertamente –, dispensará tudo isso e reclamará o espírito de renúncia, de serviço, de humildade, de paciência, de fraternidade, de sinceridade e, sobretudo, do amor de que somos credores, uns para com os outros, e a nossa vitória permanecerá muito mais na ação incessante do bem com o desprendimento da posse, na esfera de cada um, que nos próprios fundamentos da Justiça, até agora conhecidos no mundo.

Nesse instante, justamente quando os doentes e os aleijados, os pobres e os aflitos desciam da colina tomados de intenso júbilo, Malebel, o destacado funcionário de Jerusalém, exibindo terrível máscara de sarcasmo na fisionomia dantes respeitosa, voltou as costas ao Senhor, e, acompanhado por algumas centenas de pessoas bem situadas na vida, deu-se pressa em retirar-se, proferindo frases de insulto e zombaria…

O milagre dos pães fora rapidamente esquecido, dando a entender que a memória funciona dificilmente nos estômagos cheios, e, se Jesus não quis perder o contacto com a multidão, naquela hora célebre, foi obrigado a descer também.

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